“Quando eu era criança, a gente comia carnaúba. Já comi só farinha com açúcar, ou farinha com café. Às vezes, minha mãe fazia meio quilo de feijão com farofa para os filhos e meu pai, e ela tomava só o caldo”, conta o agricultor de feijão Jocicleber de Sousa, 37, um dos beneficiários do Programa Ceará Sem Fome por meio da Cozinha da Associação Para o Progresso Infantil (Aproinfa), no distrito rural de Tapera, na cidade de Morada Nova, na região do Vale do Jaguaribe.
Hoje, ele e a esposa recebem uma quentinha cada, todos os dias. “Pra mim, é uma benção. Eu valorizo essas duas quentinhas como se fossem 2 mil, porque muita gente tá passando fome por aí”, entende.
A fome também assombrou Neidiane Saraiva, 32. Em sua casa, as duas quentinhas alimentam ela, o marido e as duas filhas, de 8 e 13 anos. “Recebo R$600 do Bolsa Família pra pagar água, luz e gás. Ficavam R$200 pra feira, mas não tava dando pra quase nada. Era mais pra minhas filhas. Eu preferia passar fome. Já tive de passar duas semanas comendo só feijão limpo e seco no prato, mentindo pra minha família dizendo que tinha comida em casa pra não pedir aos meus pais”, revela
Relatos como os de Jocicleber e Neidiane não são raros na Tapera, a cerca de 30 km da sede de Morada Nova, cujo acesso é feito por uma estrada de terra bastante acidentada e entrecortada por passagens molhadas. O agente de campo Francisco Narcélio, que abastece as oito cozinhas solidárias da cidade, deixa os alimentos “grosseiros” uma vez por mês; as proteínas, de 15 em 15 dias; e as verduras, semanalmente. Tudo levado de moto, porque alguns trechos ficam quase intransitáveis.
“É difícil, mas a gente vai levando devagarzinho, se adaptando e chegando a essas cozinhas toda semana. É gratificante porque a gente vê as famílias, muitas delas sem ter o que comer. A gente pensa que não existe fome, mas existe”, observa.
Com informações do Diário do Nordeste.