sexta-feira, 19 de abril de 2019

Grupos de penitentes mantêm tradição de sair na Quinta-Feira da Semana Santa para rezar e pedir esmolas no sertão

Nos sertões de Cedro, Lavras da Mangabeira, Várzea Alegre e Barbalha grupos de penitentes percorreram estradas na noite de quinta-feira, 18, e madrugada desta Sexta-feira Santa com o objetivo de recolher doações nas casas.

Os grupos mantêm a tradição secular, rezam benditos e seguem ritual próprio da época.

A pesquisadora e escritora Cristina Couto lembrou que o costume foi mantido neste ano em Lavras da Mangabeira. “É uma tradição secular. Eles saem à noite na quinta-feira santa com cantos que lembram a idade média, pedem esmolas nas casas”, pontuou. “Em Barbalha, existe ainda a tradição de encontro de grupos de penitentes de homens e de mulheres que são as ‘incelenças'”.

Para Cristina Couto, a tradição começou por volta de 1868 com o padre Ibiapina, na Serra do Araripe. “Antigamente havia autoflagelação, mas essa prática foi proibida”, lembrou. “Na época de epidemia do cólera no sertão, doença que era atribuída a prática de pecados e os penitentes iam às casas para as pessoas se arrependerem, rezarem”.

Apesar da modernização dos tempos, o penitentes ainda mantêm suas práticas. “Como disse é uma cultura secular que precisa ser preservada e a nossa tradição pede socorro”, destacou Cristina Couto.

Penitentes em Cedro 

No sertão cearense, nessa época do ano em que os católicos celebram a Semana Santa, a religiosidade popular expressa seus ritos seculares: grupos de penitentes circulam por ruas das cidades e por estradas de localidades rurais, mantendo viva a tradição e a cultura do lugar.

O sertão se renova com as chuvas, e as manifestações folclóricas e de religiosidade popular afloram. Um exemplo vem da cidade de Cedro. Grupos de penitentes realizam caminhadas nos sítios rezando, cantando benditos e pedindo esmolas. Um deles, formado por 12 agricultores, percorre estradas de sítios e vilas rurais. Por onde passam o silêncio da noite é quebrado por rezas e cantos de benditos.

Vestidos com ‘opa’, uma espécie de bata, com cruzes, em estilo de roupa medieval e na mão portando “cacho” (chicote com lâminas de ferro afiadas), cruz e com as cabeças cobertas, os penitentes cumprem a tradição que chegou ao Cariri cearense por volta de 1850 e se espalhou por regiões vizinhas.

Antônio Cipriano, decurião, isto é, o líder do grupo e diz que se esforça para manter vivo o ritual. “O que nós fazemos é penitência, tradição e obrigação”, explicou. “Jesus sofreu por nossos pecados e nós rezamos para não cair em tentação”. Ele lembra que em 1950, o avô materno já coordenação grupo na região.

O agricultor Edenilson Batista ingressou no grupo há dois anos. “Alcancei essa graça e estou participando”, disse. “Rezamos e refletimos sobre o sofrimento de Jesus”.

Os penitentes são homens simples e abnegados, que mantêm a tradição. Identificam-se com crendices populares e dogmas religiosos. O ritual é próprio e os benditos são cantados em voz alta, misturando agudos e graves, que ecoam nas estradas e casas do sertão nordestino noite adentro.

Em frente às casas, o grupo canta e reza até que saia um morador para doar uma esmola. Às vezes são convidados pelo dono da casa, a entra e rezar, abençoando o lar, a família, como forma de agradecimento ou para expressar pedido por graças.

Os penitentes do Vale do Machado em Cedro e Lavras da Mangabeira herdaram a tradição dos avós. No passado, tiveram apoio de líderes religiosos. Hoje, o ritual resume-se a cantar em portas de amigos, nos cruzeiros nas estradas e pedir esmolas para o desjejum na Sexta-Feira Santa, quando os católicos celebram a Paixão e Morte de Jesus Cristo. Com informações do Diário do Nordeste.