segunda-feira, 29 de maio de 2017

Polícia Federal investiga licitações fraudulentas em prefeituras cearenses


No momento em que a "Operação Lava­Jato" apura crimes financeiros cometidos no topo da política brasileira e atrai as atenções de todo o País, a Polícia Federal (PF) também irá intensificar o combate à corrupção em nível municipal. As investigações de desvios de recursos públicos nas prefeituras serão reforçadas em todos os estados brasileiros, inclusive no Ceará, conforme representantes nacionais da Instituição.

A necessidade de aumentar as investigações revela uma preocupação do Serviço de Repressão a Desvios de Recursos Públicos (SRDP), situado na Sede da PF, em Brasília, a respeito dos esquemas montados para investir contra as prefeituras. "Hoje, temos uma preocupação muito grande com o nível municipal, onde verificamos que há um certo descuido por parte dos órgãos fiscalizadores. O foco maior está sendo a Lava ­Jato, então identificamos que isso gerou uma certa liberdade para os municípios e, às vezes, alguma questão de desvio não está sendo tratada da forma que achamos que deveria estar sendo", declarou o chefe da SRDP, delegado federal Rolando Alexandre de Souza.

Um dos delegados de Combate à Corrupção (Delecor) do Ceará, Joécio de Holanda, conta que a corrupção que se alastra pelo Interior do Estado se dá principalmente por meio de licitações fraudulentas. "As organizações criminosas constituem empresas de fachada para participarem das licitações. A fraude, normalmente, acontece em um conluio da iniciativa privada com o poder público e possibilita a contratação ilegal. Daí vêm os superfaturamentos e os consequentes desvios. Quando se faz um conluio desses, evidentemente, cada um sai ganhando uma parte", detalha.

Conforme Joécio Holanda, muitas vezes, as várias empresas que concorrem em uma licitação foram abertas pela mesma quadrilha, mas nenhuma tem capacidade operacional, empregados ou mesmo sede física. O delegado afirma, ainda, que as comissões de licitações das prefeituras são formadas por pessoas consideradas de confiança dos gestores, mas que, na maioria dos casos, não têm conhecimento jurídico para analisarem os contratos.

O chefe da Divisão de Repressão a Crimes Financeiros (DFIN), delegado João Vianey Xavier Filho, lembra que as delegacias que apuram crimes financeiros e corrupção em todo o Brasil têm vários inquéritos contra prefeituras por apurar e que a intensificação de operações pode ser aguardada, pela população, nos próximos anos.

"Temos muito serviço na fila, em andamento ou aguardando o melhor momento para ser iniciado. Às vezes, são questões de oportunidade para se iniciar a investigação, mas existem muitas coisas acontecendo e desdobramentos de operações de destaque ainda estão surgindo. Então, são anos e anos pela frente de muito trabalho já garantido, fora o que venha a surgir", revelou o delegado.

João Vianey Filho afirma que esses crimes decorrentes das fraudes nas Prefeituras, geralmente, são acompanhados de outros, como a lavagem de dinheiro. As práticas ilícitas incluem até o envio do dinheiro desviado em nível municipal para o exterior.

"É muito comum, principalmente quando se tem crimes de desvio, os investigados precisarem esquentar o dinheiro proveniente de qualquer espécie de propina ou superfaturamento. É muito usada a figura de doleiros, hoje chamados de operadores financeiros. Eles fazem operações de troca de moedas, em grande, média ou pequena quantidade, para que o dinheiro desapareça no Brasil e surja em outro País, que tem políticas de paraíso fiscal. Isso se aplica em qualquer nível de corrupção e crimes financeiros, inclusive municipal", completa João Vianey.

Consequências

Segundo o chefe do SRDP, Rolando de Souza, os órgãos fiscalizadores têm dificuldades para apurar desvios de recursos em nível municipal, principalmente em cidades do Interior. A consequência da corrupção é a deterioração dos serviços públicos que devem ser ofertados para a população desses municípios. "Na conta, falta muito. As pessoas morrem nas filas de hospitais, não têm sala de aula para estudar, porque o dinheiro chega, mas não é aplicado onde deveria".

Joécio de Holanda ratifica que as áreas mais afetadas pelos esquemas de corrupção são Saúde e Educação, por recebem repasses de altos valores. "A corrupção é um dos crimes mais graves, senão o mais grave. As consequências da corrupção sistêmica no Brasil são desastrosas. Esse abismo que existe entre as poucas pessoas que têm muito poder aquisitivo e a grande maioria da população brasileira é uma consequência direta da corrupção", ressaltou.

Conscientização

João Vianey Filho espera que as grandes operações realizadas no País tenham o papel de conscientizar outros agentes públicos a não se corromperem. "O desafio é, a partir dessa atuação, ter um reflexo pedagógico, frente à sociedade para que fique claro que a eventual conduta delituosa vai ter uma consequência, isso é muito importante para que haja uma reversão do quadro criminoso. Se quem está delinquindo tiver a certeza que isso vai gerar uma repercussão negativa, que ele vai ser investigado e virá a ser preso, processado e eventualmente condenado, ajudará muito na redução dos casos", afirma.

Joécio Holanda diz que acredita está havendo uma mudança de postura da sociedade, no enfrentamento à corrupção. "Acho que está havendo uma mudança gradual de cultura, entendimento e percepção da corrupção pelo povo. E a identificação do que se entende por criminoso também, porque essas pessoas, políticos e empresários, não eram identificadas como criminosas", acrescentou o delegado.

 

Fonte Diário do Nordeste