sábado, 29 de abril de 2017

Seca acabou com o sonho da criação de tilápia em cativeiro

As gaiolas, que antes flutuavam sob a água, agora estão sobre a terra ( Fotos: Honório Barbosa )

Orós. A escassez de água nos dois maiores reservatórios do Estado do Ceará, Orós e Castanhão, além de afetar e colocar em risco abastecimento de água de dezenas de centros urbanos nos vales do Médio e Baixo Jaguaribe e na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), destruiu a economia e o sonho de centenas de famílias que melhoraram de vida a partir da criação de tilápia em cativeiro.

"O nosso sonho acabou. Era uma mina de ouro, mas foi rápido", lamentou o pescador Abrão Pedro da Silva, 49, que era produtor de tilápia na bacia do Açude Orós, na localidade de Pereiro dos Pedros. "Todos nós acreditamos no governo, investimos, trabalhamos, mas secaram o açude, levando água para a região de Fortaleza", disse. "No meu caso, a dívida é de R$ 60 mil, no Banco do Brasil".

Endividados

As famílias estão endividadas, não há trabalho e renda. As vilas começam a ficar esvaziadas. Alguns já viajaram em busca de emprego em São Paulo, outros em municípios da região, como Iguatu. A maioria procura vaga de garçom, pois antes do projeto de produção de pescado em tanques redes iniciar, alguns já trabalhavam nessa atividade.

Quem chega às localidades ribeirinhas, fica admirado com o distanciamento das águas. As terras que estavam cobertas com uma lâmina de água superior a seis metros, agora estão cheias de vegetação, graças às últimas chuvas, e há gado pastando. "No verão, vai ficar tudo seco, com aquelas rachaduras no solo", observa o produtor José Custódio, que indaga: "Quando esse açude vai encher de novo?".

A incerteza de quando haverá recarga significativa no Açude Orós e a impossibilidade de retomada da atividade produtiva a médio prazo criam um sentimento misto de tristeza, frustração e raiva contra o governo. Afinal, para a maioria dos produtores rurais, apesar do quadro de chuvas abaixo da média desde 2012, e falta de recargas nos últimos anos, a decisão de liberar água do reservatório desde setembro de 2016 foi uma decisão fatal para o fim dos criatórios.

Abandono

Nas localidades de Pereiro dos Pedros, Brejinho, Jardim, Jurema, Baixas as gaiolas que antes estavam cheias de alevinos e pescado flutuando sob a água, agora estão abandonadas sobre a terra, ao relento, na margem do açude e guardadas em depósitos precários.

O integrante da Bacia do Alto Jaguaribe, Paulo Landim, diz que, mais uma vez, o Orós liberou água para atender demandas no Baixo Jaguaribe e na RMF com uso na agropecuária, e na indústria, em criatórios de camarão, sem ocorrer uma recompensa para os produtores rurais. "Esse pessoal acreditou no projeto, contraiu financiamentos e estava ganhando dinheiro, mas secaram o açude, não apenas para o consumo humano, sem oferecer nenhuma forma de recompensa", afirma.

Na Bacia do Açude Orós, incluindo localidades do próprio Município e de Quixelô, havia cerca de 700 famílias envolvidas na atividade de produção de tilápia em cativeiro. Cada participante de grupo produtivo obtinha uma renda mensal em torno de mil reais. Somente em Pereiro dos Pedros, eram 136 famílias envolvidas. "Aqui havia renda, mas agora ficamos na miséria", lamenta o produtor Edmilson Pedro da Silva.

Revolta

Sentado no alpendre de casa, ao lado da mulher e de um irmão, Edmilson mostra-se revoltado e desanimado. "Não sabemos quando vamos produzir novamente e eu não quero nem saber quanto estou devendo ao banco, mas sei que é muito e não tenho com que pagar", desabafou. Ele passa o dia olhando para a bacia do Orós, que antes tinha água, mas agora só pastagem e plantio em pequenas vazantes de milho e feijão, além de alguns animais pastando.

"O inverno está bom para a agricultura, mas o milho e feijão não dão a renda que o peixe dava", frisou. A vila de Pereiro dos Pedros está esvaziada, com homens mais velhos e jovens sentados, jogando conversa fora, por falta de ocupação e ainda desorientados com a paralisação da atividade. "Não me disseram que iam secar o açude", volta a reclamar Abrão Pedro da Silva. "Fiz investimentos, ampliei o número de gaiolas e perdi tudo", relata.
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